Amitabha no Buddhismo Tibetano
As terras puras são domínios de manifestação
criados pelos Buddhas. Assim, a Terra da Beatitude foi criado por Amitabha,
o Buddha da Luz Infinita, como conclusão das aspirações que tinha formulado,
antes de sua obtenção do Despertar, para a manifestação de um campo puro de
fácil acesso. Neste campo, a escala de tempo é muito diferente da nossa. Um
dia aí e o equivalente a um maha-kalpa em um universo ordinário, um
maha-kalpa sendo constituído por oitenta kalpas intermediários que
englobam a gênese, a manutenção e a destruição de um universo, bem como o
período vazio que precede uma nova manifestação. É uma duração quase
incalculável em anos terrestres. A criação da Terra da Beatitude equivale a
dez dias de sua escala temporal, isto é, dez maha-kalpas de nossa
própria escala.
É uma terra onde todas manifestações dos cinco
elementos e todas percepções sensoriais são alegria, prazer e beleza. A
palavra sofrimento é aí desconhecida. As coisas e os seres são de uma
qualidade imaterial e luminosa e, como o corpo de Amitabha emite uma luz
mais resplandecente que o sol e a lua, sempre é dia neste campo. Entretanto,
uma coisa permite distinguir a sucessão dos dias e das noites: de dia as
flores abrem-se, à noite elas se fecham.
O renascimento na Terra da Beatitude só é
possível após certa preparação durante esta vida: receber a iniciação de
Amitabha, ou de Avalokiteshvara (tib. Chenrezi), recitar seus
mantras, realizar aspirações e orações. Pela orientação assim dada à nossa
mente, quando estivermos no bardo tomaremos consciência de que estamos
mortos e veremos Amitabha vindo nos acolher. Nós o reconheceremos,
desejaremos renascer em seu campo puro e apenas este pensamento será
suficiente para que imediatamente possamos ir para lá. Então é o fim do
bardo e o renascimento espontâneo, sem nada intermediário, na Terra da
Beatitude. Neste, somos dotados imediatamente de um corpo de um jovem
adulto, bem constituído, trajando belas roupas e nascemos no coração de uma
flor de lótus. Depois, o lótus abre-se, vemos Amitabha e seu círculo e
obtemos a primeira terra de bodhisattva. Esta obtenção descarta qualquer
possibilidade de renascer nas seis classes de seres sob a sujeição do karma
e engendra uma imensa dilatação das faculdades da mente: o bodhisattva da
primeira terra pode produzir cem emanações simultâneas de si mesmo, ir ao
mesmo tempo a cem terras puras, receber os ensinamentos de cem Buddhas,
concentrar a mente em cem objetos, etc. Possui, assim, doze poderes
cêntuplos.
De uma maneira geral, para renascer na Terra da
Beatitude é preciso reunir quatro fatores.
- O suporte: visualizar
o campo de acumulação. Visualiza-se interiormente a Terra da Beatitude
como um lugar agradável e belo. Vê-se ali Amitabha e ao seu lado
Avalokita e Vajrapani (tib. Chanadorje), e, à sua volta,
inumeráveis arhats e bodhisattvas. Imagina-se que todos estão realmente
à nossa frente.
- A causa fundamental:
acumulação e purificação. Apresenta-se, em imaginação, diante do suporte
visualizado, infinitas oferendas. Rende-se homenagem pelo corpo, palavra
e mente, confessam-se as faltas realizadas durante as inumeráveis vidas
passadas e pensa-se que se está purificado.
- O auxiliar: engendrar
a mente do despertar (tib. bodhichitta). Desenvolve-se a
compaixão por todos os seres, mais particularmente em relação à Terra da
Beatitude, formulando aspirações, sempre em presença do campo de
acumulação: "Que todos os seres fiquem livres do sofrimento, que todos
possuam a felicidade. Que todos possam renascer na Terra da Beatitude.
Que eu mesmo possa renascer ali e conduzir para lá todos os seres".
- A condição operante:
as aspirações perfeitas. Engendrando uma profunda aspiração, pensa-se:
"Que eu possa renascer na Terra da Beatitude".
Para ir a qualquer lugar de carro, é preciso um
veículo em bom estado, um bom motorista e tomar a decisão de ir ao local
escolhido. Para ir aa Terra da Beatitude, também é preciso, além do terreno
interior favorável, ter o desejo de ir até lá.
Quando esses quatro
fatores estão reunidos, torna-se praticamente impossível não renascer na
Terra da Beatitude. Porém, há um obstáculo que pode nos impedir. Nossa
apreensão egocêntrica é muito forte, o que faz com que sejamos muito
apegados a nossos próximos: pais, filhos, marido, mulher e amigos.
Quando estivermos mortos e nossa consciência experimentar o bardo, por causa
do desejo de renascer na Terra da Beatitude, do qual estaremos impregnados,
a aspiração surgirá em nossa mente e pensaremos: "Vou para a Terra da
Beatitude". Esse pensamento dará por si só o impulso necessário e teremos a
impressão de voar no espaço para atingir nosso destino.É aí que o apego a
nossos próximos pode ser um contrapeso. Se ele for muito forte, ouviremos
como se a voz da pessoa a qual permanecemos muito apegados dissesse: "Não me
abandone, não vá à Terra da Beatitude". Essa voz será muito nítida e muito
envolvente. A força do apego nos levará então a querer olhar aquele ou
aquela que nos chama. Nos viraremos e o desejo de ir à Terra da Beatitude
abandonará nossa mente.
Existe um método para escapar desse perigo.
Consideremos desde já que nosso corpo, nossos bens e todos aqueles a quem
somos apegados constituem um mandala que oferecemos a Amitabha e pensamos:
"Tudo isto eu ofereço a ti Amitabha. A partir de agora isto não me pertence
mais, mas somente a ti".
O benefício dessa oferenda é duplo: de um
lado, permite acumular mérito, de outro lado, o apego diminui. Quando, em
particular, formos tocados por uma doença, cujo fim será fatal, será preciso
que pensemos: "Morrerei logo. Meu corpo é o suporte da doença e dos
sofrimentos que suporto agora, mas ele não me pertence mais: eu o ofereci a
Amitabha. Todos os que me são caros, pais, filhos, esposo ou esposa, irmãos,
irmãs e amigos, eu também os ofereci a Amitabha. Não tenho mais que me
preocupar com eles. Esta doença vai me levar à morte, mas estou muito feliz,
pois vou abandonar este mundo de sofrimentos para ir à Terra da Beatitude".
Assim, nenhum obstáculo poderá impedir-nos de lá renascer.
A força da
mente é muito grande. Ela tem o poder de realizar seus objetivos, ainda mais
se estiver apoiada na fé nos Buddhas, nos bodhisattvas e nos mestres.

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Há muito tempo, vivia um homem velho e
corajoso, muito hábil em sua profissão de carpinteiro, mas muito
pobre de inteligência, não tendo nenhum conhecimento do Dharma. Sua
filha, em contrapartida, possuía uma boa mente, que aplicava tanto
nos negócios deste mundo quanto nas questões espirituais. O
carpinteiro amava-a muito e sua confiança nela era tão grande que
ele fazia, sem nunca lhe perguntar o porquê, tudo o que ela lhe
dizia. A filha, consciente de que se aproximava a hora de seu pai
abandonar este mundo, gostaria de ensinar-lhe pelo menos alguns
rudimentos do Dharma para ajudá-lo na passagem para o além, mas ela
sabia que, mesmo isto, ele não poderia compreender. O que fazer para
ajudá-lo? Refletindo, encontrou um meio. Uma noite, disse para seu
pai que ela estava muito feliz e contou-lhe o que tinha acontecido:
"Você sabe, meu pai, quem eu encontrei hoje? Um homem vindo de um
país muito belo, situado no sol poente, que se chama Terra da
Beatitude. Ele foi enviado por um lama muito bom que vive lá. Sua
reputação de carpinteiro, meu pai, é tão grande que chegou até ele,
tanto que ele quer que você lhe construa uma casa. Não é
maravilhoso? Eu não hesitei em dar meu consentimento por você, ainda
que o trabalho será muito bem pago. Quanto à data de realização do
trabalho, ela ainda não foi definida e, no momento certo você ficará
sabendo".
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O carpinteiro pensou que o lama do qual sua filha
falara só poderia ser alguém muito poderoso que reinava em um país muito
grande. E já que sua filha tinha dado seu consentimento, ele iria. De tempos
em tempos, ela lhe falava de novo dessa longínqua Terra da Beatitude, de
seus parques encantadores, da suavidade do clima, da gentileza de seus
habitantes e da grandeza do lama que o governava, de maneira que o desejo de
ir para lê tornava-se cada vez mais intenso na mente do carpinteiro.
Logo o pai ficou doente e a doença piorou
rapidamente.
— Não tenha medo — dizia-lhe, entretanto a filha — logo
você ficará curado. O momento de ir à Terra da Beatitude construir a casa
aproxima-se. Não se esqueça que fiz a promessa por você e que você deve ir
até lá.
O pai acreditava, assim, que iria se curar. Mas seu estado
continuava a piorar. Quando estava prestes a morrer, a filha disse-lhe
ainda:
— Meu pai, hoje é um grande dia. O momento de ir à Terra da
Beatitude chegou. Você deve ir. Você ficará curado e irá.
Persuadido
de que era verdade, ele morreu com esse pensamento. Quando, após o período
de inconsciência que segue a morte, ele despertou no bardo, esse mesmo
pensamento foi o primeiro a apresentar-se a sua mente: "Minha filha me disse
eu devo agora ir para a Terra da Beatitude".
Então, Amitabha e seu
círculo apareceram-lhe e ele foi para onde sua aspiração o guiava.
O
velho homem não conhecia o Dharma, mas tinha confiança em sua filha que o
amava e tomara por verdadeiro tudo o que ela lhe dizia. Portanto, ele estava
convencido da existência desse lugar delicioso chamada Terra da Beatitude,
onde vivia um lama muito poderoso. Pensar que ele iria para esse país
causava-lhe uma grande alegria, e sua aspiração de ir até lá era muito
forte. A ausência de dúvidas e a orientação determinada de sua mente fizeram
com que ele fosse para lá efetivamente.
Mesmo que não possamos nos
consagrar de modo intenso à acumulação de mérito e à purificação, se,
simplesmente desenvolvermos a aspiração de renascer na Terra da Beatitude,
se orarmos sinceramente para isso, e se, com uma grande fé, recitarmos os
textos que exprimem essa aspiração, quando morrermos, pela conjunção de
nossos próprios desejos e os de Amitabha, renasceremos nesse domínio de
manifestação pura.
O acesso à Terra da Beatitude implica a obtenção
automática da primeira terra de bodhisattva. Ali, somos totalmente livres do
sofrimento, já que é dito que ali não se encontra nem mesmo um único fio de
cabelo de sofrimento. Por outro lado, adquirem-se aptidões muito mais vastas
que aquelas que dispomos atualmente: principalmente a capacidade de produzir
cem emanações de nós mesmos, não sob sujeição do karma, mas livremente, com
objetivo de socorrer os seres da Terra ou de outros mundos.
A noção de terra pura é abordada de modo
sensivelmente diferente no Ocidente e no Oriente. Os tibetanos e os chineses
ou os japoneses são os herdeiros de uma tradição buddhista muito antiga, de
modo que admitem espontaneamente, sem sentir a menor dúvida, da realidade da
Terra da Beatitude. Orar para renascer ali é um prolongamento natural da fé
deles. Os ocidentais encontram-se em uma posição diferente: de um lado, o
buddhismo não está enraizado em seu meio cultural; de outro lado,
desenvolveram, durante seus estudos, uma mente muito crítica. Tanto que,
mesmo que considerem a possibilidade da existência da Terra da Beatitude,
eles o fazem mais como hipótese do que como certeza.
Entretanto,
considerando sua inteligência e sua poderosa capacidade de estudar, os
ocidentais podem facilmente compreender os ensinamentos do Buddha e o da
Terra da Beatitude e apreender sua autenticidade, assim como sua natureza
inteiramente benéfica. Eles poderão a partir de então ter a mesma convicção
que os orientais.
Questão: A Terra da Beatitude
possui uma existência em si ou é apenas uma projeção da mente?
Kalu Rinpoche: As terras puras são o resultado das aspirações dos
Buddhas e dos bodhisattvas para o bem dos seres.
Renascer na Terra da Beatitude não significa
atingir o estado de Buddha, mas somente a primeira terra de bodhisattva.
Portanto, ainda é preciso percorrer as dez terras que levam ao Despertar
último. É preciso observar também que a partir do momento em que se alcança
esse domínio de manifestação, não é mais possível recair no samsara.
Kalu Rinpoche. Ensinamentos Fundamentais do Budismo Tibetano:
Budismo Vivo, Budismo Profundo, Budismo Esotérico. Tradução de Célia
Gambini, revisão técnica de Antonio Carlos da Ressurreição Xavier. Brasília:
Shisil, 1999
A
Mandala ao lado é do Buda Amitaba e serve para autoconhecimento, para fazer
a praticom ela clique nela e veja a forma correta de fazer o exercicio
corretamente.
Ler obras espirituais nos faz evoluir espiritualmente.
Leia nossos textos para sua evolução
espiritual, eles são espirituais, ou
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