Como a Psicanálise vê o Autoconhecimento e o Nirvana?

Entrevista com Igor Teo

O Dr. Igor Teo é formado em Psicologia e mestre em Psicanálise. Atua como terapeuta e é autor de livros sobre filosofia e espiritualidade.

Perguntas: Ryath

Como a Psicanálise descreve o processo de autoconhecimento?

A psicanálise não trabalha exatamente com uma ideia de autoconhecimento. A razão é simples. Não existe autoconhecimento, na medida em que ninguém pode conhecer inteiramente a si mesmo. Foi isso que Freud descobriu com o inconsciente. Existem camadas de nós mesmos que estão restritas e escondidas de nossa consciência através da barreira do recalque. Toda tentativa de atravessar será sempre mediado pelo nosso recalque e narcisismo. O que impõe uma grande restrição ao que podemos descobrir. O autoconhecimento na psicanálise passa necessarimente pela mediação de um outro que me vê e diz algo de mim. Daí a função do analista na sessão terapêutica. Ele pode apontar aquilo que nossas resistências mais severas ao autoconhecimento não estão dispostas a aceitar. 

A iluminação, Nirvana, existe para a Psicanálise?

O que seria a Iluminação? Um estado final de contentamento e ausência de conflitos? A psicanálise não tem evidências empíricas disso em seu pouco mais de cem anos de existência. É claro que conhecemos relatos deste tipo em experiências religiosas, mas não é algo que podemos propor como uma terapêutica absoluta e geral, já que cada um tem a sua própria forma de ver e se organizar na vida. Se em muitas experiências religiosas há esse tipo de estado, não é algo que a psicanálise possa propor porque cada um deve encontrar a sua própria espiritualidade sem a imposição de um modelo correto pelo terapeuta. A psicanálise entende que a vida é regida por conflitos. Haveria um final de análise em que não haveria mais conflitos? Freud se dedicou a pensar isso na questão entre a análise finita e infinita, e chegou a ideia de um rochedo da castração: a terapia analítica é finita porque existem grandes questões na vida sem soluções, e que não iremos mais além deles, mas também infinita porque estamos vivos e em abertura na vida, podendo surgir novos conflitos a partir disso e que podemos sim ainda tratar em análise. Talvez não haja um Iluminado, mas um estado em que podemos carregar uma vela para mantermos iluminadas as coisas que vão surgindo por aí.

É verdade que com ganho de autoconhecimento ou do Nirvana o Id diminui e aumenta o Super-Ego?

Freud pensa, na segunda tópica, o Id como um reservatório pulsional que responde por nossos interesses mais instintuais, enquanto o superego seria a influência externa da moral e da cultura transmitida por pais e educadores que moldam nossas pulsões a se adaptarem - com alguma insatisfação - às regras e vivências sociais. É um modelo inicial para representar o conflito entre nossos desejos e a lei. Este modelo já foi revisto e ampliado na psicanálise contemporânea. Lacan, por exemplo, trabalha com a ideia de que desejo e lei não estão em oposição, mas um depende do outro. O desejo nasce justamente da incidência da lei. Com isso, quero dizer que talvez não seja uma oposição entre Id e superego, mas nossos desejos também são moldados pela cultura a qual nos submetemos. No avanço do trabalho pessoal, o que esteja em jogo talvez não seja um ganho de moral superegóica sobre o id instintual, muito menos uma libertação do id frente ao superego repressor, mas uma forma de se colocar de maneira reflexiva entre lei e desejo, cultura e natureza, prazer e sociedade. Penso que se trata de um distanciamento dessas determinações mais básicas para repensar nosso lugar na vida em relação a essas coisas que nos determinam.


Como é a personalidade de um Iluminado?

Como a minha, ou como a sua, ou como de qualquer um, e talvez como nenhuma dentre elas (rs). Acho que ideais nesse sentido perdem a importante noção que a ética é situacional. Como dizer a maneira certa de agir sem estar na situação avaliando as possibilidades e consequências? Dizer que devemos ser de uma determinada maneira faz com que as pessoas queiram imitar comportamentos e realizá-los fora de seus contextos necessários. 

É verdade que um iluminado tem um grande desprendimento de seu ego?

É verdade que uma grande dose de narcisismo é uma grande dificuldade para a vida. Causa muito sofrimento. Estamos constantemente colocando nosso valor em questão, fazer coisas para provar aos outros e nos sentimos feridos. Também colocamos nossas necessidades pessoais a frente dos outros, e isto não é bom para nenhuma comunidade. Um trabalho pessoal deve levar sim a que nós, se não podemos viver totalmente abandonados de todo narcisismo, pelo menos lidar com isso de maneira mais salutar.

Um paciente de Psicanálise poderia atingir o Nirvana com as técnicas de autoconhecimento dentro da terapia?

 Creio que não é o lugar adequado para isso. Ele pode seguir com suas técnicas espirituais dentro do contexto ao qual frequenta. Na análise, podemos lidar com seus conflitos conscientes e inconscientes em relação a muitas coisas, inclusive em relação a sua própria espiritualidade. Não vamos dizer como ele vai alcançar o seu Nirvana, isto é com ele. Mas podemos escutá-lo e tentar ajudá-lo a lidar com seu conflito em questão.

Freud poderia ser um iluminado ou alguém elevado por conseguir ter grande descoberta sobre o interior humano?

Freud já foi bastante megalomaníaco (rs). Ele publicou a Interpretação dos Sonhos em 1899 com a data de 1900 porque acreditava que seu livro abriria as portas do novo milênio com descobertas que mudariam para sempre nossa forma de ver o mundo e a nós mesmos. Podemos criticar seu narcisismo com tal crença, mas é verdade que ele estava correto. Freud é hoje o intelectual mais citado em todas as nossas ciências, independente do campo. Mas Freud mesmo não tinha muitas ilusões sobre a sua personalidade. Analisava constantemente a si mesmo e tinha poucas esperanças de uma salvação para a humanidade. Esta foi a razão de seu conflito com Einstein. Enquanto o físico lhe escreveu pedindo conselhos para alcançar a paz mundial, Freud disse que descobriu com o inconsciente que o ser humano está sempre propenso a alguma dose de violência. 

Foi com Freud que começou as técnicas de Psicoterapia?

A ideia de psicoterapia podemos remontar pelo menos até os gregos antigos em seus exercícios espirituais na filosofia. Claro que não com este nome. Mas muitas práticas da psicologia moderna já se encontravam presentes nos conselhos dos filósofos gregos e helenistas. Porém, Freud pode ser considerado o precursor da psicoterapia moderna por fundar com a psicanálise um método de pesquisa e clínica do sofrimento humano dentro dos ideais de alguma cientificidade.

O que é o altruísmo?

Demonstrar um interesse genuíno pelo outro. Quão genuíno? Muitos dirão que mesmo o mais autêntico interesse pelo outro passa por um interesse egoísta na medida em que só me interesso pelo outro quando este também interessa a mim. É uma questão interessante. Eu escrevi sobre isso no meu texto Somos os nossos instintos? https://medium.com/@igorteo/somos-os-nossos-instintos-4b09207657e9
 
O que uma pessoa poderia fazer para atingir o autoconhecimento?

Isso depende da tradição espiritual da qual ela faz parte. Mas eu recomendo a todos fazerem análise (rs)

 

Todos os  nossos textos podem ser reproduzidos.

Convidamos você para conhecer nosso site, se desejar, trabalhamos para sua evolução, e é nossa alegria a sua visita e leitura.

Recomendamos as seções: Realidade Espiritual e Energética, Textos para se Iluminar, Nirvana e Mestres Ascensos, Mandalas e Outras Práticas.

 

 Voltar a Pagina Inicial