|
Essencia do Zen
Entre os oitenta e quatro mil ensinamentos do budismo, o Ch'an
[Zen em japonês] é o mais entusiasticamente estudado e discutido no
mundo de hoje. Embora uma vez confinado ao leste onde teve origem, nos dias
de hoje o estudo do Ch'an captou a atenção e o interesse do ocidente. Por
exemplo, muitas universidades dos Estados Unidos estabeleceram grupos de
meditação. É encorajador ver que a meditação está se espalhando da reclusão
dos monastérios para o mundo moderno, onde está desempenhando papel muito
importante. Descrever o Ch'an não é uma tarefa fácil, porque o Ch'an não é algo
que possa ser discutido ou expresso em palavras. No momento em que a
linguagem é usada para explicar o Ch'an, não estamos mais considerando seu
verdadeiro espírito. O Ch'an está além de todas as palavras, contudo não se
pode deixá-lo inexpresso. Qual é a origem do Ch'an? O Ch'an é a forma
abreviada da transliteração chinesa do termo sânscrito dhyana, que
significa contemplação tranqüila. Originado na Índia, a lenda conta que
durante uma assembléia no Pico do Abutre (Grdhrakuta), o Buda apanhou
uma flor e, levantando-a, mostrou-a à assembléia sem dizer palavra. Os
milhões de seres celestiais e humanos que estavam reunidos na assembléia não
entenderam o que Buda queria significar, exceto Mahakashyapa, que sorriu.
Assim, o Ch'an foi transmitido sem utilizar nenhuma palavra oral ou escrita:
foi transmitido de mente para mente. Mais tarde, o Ch'an foi introduzido na
China. Durante a época do Sexto Patriarca Hui Neng, o Ch'an floresceu e
desenvolveu-se em cinco escolas, que se tornaram as principais correntes do
budismo chinês. O que é o Ch'an? O Mestre Ch'an Ching Yuang disse que o Ch'an é
nossa mente. Esta mente não é aquela que discrimina e reconhece as coisas.
Ela é nossa "verdadeira mente." Essa verdadeira mente transcende toda a
existência tangível, contudo manifesta-se em toda existência do universo.
Mesmo as coisas mais comuns no universo estão cheias das sutilezas do Ch'an. O Mestre Ch'an Pai Chang disse que o Ch'an é a vivência diária. Ele
disse que rachar lenha, carregar água, vestir-se, comer, ficar de pé e
andar, tudo é Ch'an. O Ch'an não é algo misterioso. O Ch'an está relacionado
com nossa vida diária. Portanto, cada um de nós pode experimentar o Ch'an. Hoje, o mundo interior das pessoas está freqüentemente em conflito
com o mundo exterior, e a vida torna-se um fardo e um aborrecimento. Elas
não podem ter prazer e captar os momentos oportunos do Ch'an na vida diária.
Em contraste, os mestres Ch'an são bem humorados e interessantes. Apenas com
poucas sentenças, eles podem livrar-se das nossas preocupações e inquietação
e guiar-nos para a verdadeira felicidade. Esta transformação para a
felicidade é bem parecida como fazer girar uma máquina complexa simplesmente
pressionando um botão. Nenhum conhecimento complicado ou repetitivo é
requerido. O estado da mente no Ch'an é muito alegre e vivaz. Qual é o valor do Ch'an ? Quando aplicado na vida diária, o Ch'an acrescenta colorido. Expande nossas mentes, enriquece nossas vidas, eleva nosso caráter, ajuda-nos a aperfeiçoar nossa moral e leva-nos ao estado em que estaremos tranqüilos quando nos encontrarmos na beira da vida e da morte. Quais foram então os ensinamentos maravilhosos que os mestres Ch'an legaram por escrito e passaram para nós? Como podemos tentar compreender o deleite do Ch'an através do uso da linguagem? Ter e Não Ter
Estamos acostumados a pensar que toda existência pode ser
diferenciada por nomes e relatadas em termos de dualidade. Na realidade, as
coisas não podem ser divididas em metades distintas. Por exemplo, a maior
parte das pessoas pensa usualmente que "ter" e "não ter" são dois conceitos
opostos; se alguém "tem" então ele não pode estar no estado de "não ter" ;
se alguém "não tem" então ele não pode estar no estado de "ter." Para elas
"ter" e "não ter" não são coexistentes. A fala e o comportamento dos mestres
Ch'an transcendem os conceitos comuns de "ter" e "não ter" abraçando estes
conceitos aparentemente opostos e alcançando um nível mais alto de "ter" e
"não ter." Suas visões são diferentes daquelas das pessoas comuns; se nós
nos aproximarmos deste modo de pensar com o nosso conhecimento habitual, não
seremos capazes de entender verdadeiramente os mestres Ch'an. Quando o Quinto Patriarca quis passar o manto e a tigela, símbolos
do Dharma, a um sucessor, ele pediu a cada um de seus discípulos que
escrevesse um verso no qual poderia julgar quem, entre eles, tinha realizado
a Verdade. O manto e a tigela apenas seriam entregues àquele que se tornaria
o Sexto Patriarca. Seu discípulo mais velho, Shen-hsu, escreveu o seguinte
verso: O Corpo é uma árvore Bodhi Depois de ler este verso, todos elogiaram Shen-hsu dizendo que seu
estado de mente era na verdade superior. O Quinto Patriarca pensava de modo
diferente e disse "Não é mau, mas o escritor dessa obra ainda não viu o
caminho." Hui Neng, que trabalhava no moinho de arroz, pediu nessa noite que
alguém escrevesse também seu verso na parede: Bodhi não tem nada a ver com árvores Depois de ler este verso, o Quinto Patriarca sabia que Hui Neng
tinha visto a natureza vazia de todos os Dharmas e entrado no caminho de
Buda. Assim, ele entregou o manto e a tigela da linhagem da escola Ch'an a
Hui Neng que se tornou o Sexto Patriarca. Shen-hsu possuía um bom entendimento dos princípios do Ch'an e era
o chefe dos discípulos do Quinto Patriarca. Como o Quinto Patriarca também
havia instruído os outros discípulos a praticar de acordo com os versos de
Shen-hsu, todos do monastério esperavam que ele, certamente, se tornasse o
Sexto Patriarca. Em vez disso, o Quinto Patriarca escolheu Hui Neng de quem
ninguém ouvira falar antes. Embora Shen-hsu tivesse alcançado um estado
espiritual elevado, ainda estava apegado à mente de "ter" e seu conhecimento
do Ch'an ainda não era o mais elevado. O caminho último é aquele que integra o "ter" como o "vazio" (shunyata).
Esta é a diferença entre a mente Ch'an e a mente comum. Apenas quando
pudermos transcender o "ter" e o "não ter" é que poderemos realizar a mente
Ch'an última e experimentar a maravilhosa verdade do Ch'an. Vamos ilustrar com outro caso bem conhecido na história do Ch'an.
Um dia, alguém perguntou ao Mestre Ch'an Chao Chou: "O que significa Chao
Chou?" Chao Chou respondeu: "Portão leste, portão oeste, portão sul,
portão norte." Essa resposta pareceu totalmente irrelevante, mas de fato, esta
verdade dos quatro portões tinha um significado oculto. Queria dizer que o
Ch'an de Chao Chou era muito vasto e não era limitado por qualquer escola
particular. O Ch'an não é, de modo alguma, confinado pelo espaço. Alguém perguntou a Chao Chou: "Os cães têm a natureza de Buda? Chao Chou respondeu: "Sim." Uma outra pessoa fez-lhe a mesma pergunta: "Os cães têm a natureza
de Buda?" Desta vez, Chao Chou respondeu: "Não." Por que o Mestre Ch'an Chao Chou deu duas respostas diferentes para
a mesma pergunta? Do ponto de vista terreno, era bastante contraditório, mas
para o Mestre Ch'an Chao Chou, elas eram um modo vivo de ensinar. Quando ele
disse: "sim" queria dizer que os cães têm o potencial para se tornar Budas.
Quando ele disse "não", significava que os cães ainda não tinham se tornado
Budas. Ao responder uma pergunta, os mestres Ch'an têm o cuidado de
determinar a intenção e o estado de mente da pessoa que faz a pergunta antes
de dar a resposta apropriada. O Imperador Wu, da Dinastia Liang, era um dos mais devotados
budistas da história chinesa. Durante seu reinado ele construiu muitos
templos, estátuas de Buda, estradas e pontes. Foi nessa época que
Bodhidharma veio da Índia para a China a fim de propagar o Dharma. O
Imperador Wu perguntou-lhe: "eu fiz muitas coisas boas, quais os méritos que
acumulei?" Bodhidharma respondeu friamente:"Nenhum mérito, de modo algum." O Imperador não ficou muito feliz com a resposta e insistiu outra
vez. Mais tarde, Bodhidharma foi embora porque não podia se entender com o
Imperador Wu. Realmente como era possível que os bons feitos do Imperador Wu
não tivessem produzido nenhum mérito? Quando Bodhidharma disse: "nenhum
mérito, de modo algum", ele queria dizer que na mente de um mestre Ch'an não
há este conceito dualístico de "ter" e não ter", como é experimentado pela
mente comum. De modo geral, percebemos e diferenciamos as coisas através de
nossos sentidos. Por exemplo, quando olhamos para uma montanha ou um rio,
vemos apenas uma montanha ou um rio. Depois que começamos a praticar o
Ch'an, percebemos que tudo na existência é ilusório. Neste ponto, a montanha
não é mais montanha e o rio não é mais um rio. Quando alcançamos completa
realização, todos os conceitos relativos de "é" e "não é", "mente" e
"matéria", tornam-se completamente integrados. Neste ponto, a montanha é
outra vez uma montanha e o rio é outra vez um rio. A mente do Ch'an
tornou-se unificada com o ambiente externo. O som que flui dos rios torna-se
o Dharma maravilhoso. Montanhas verdes tornam-se os corpos puros dos Budas.
O mundo do Ch'an é ilimitado quando a relativa fronteira do "ter" e "não
ter" é destruída. Movimento e Imobilidade
A doutrina básica do budismo são os Três Selos do Dharma, que
declara que "Todos os samskaras (agregados) são impermanentes."
"Todos os dharmas não têm um eu substancial", e "O nirvana é a
paz verdadeira." O objetivo último de estudar o budismo é alcançar o estado
de paz perfeita, nirvana. A "perfeita paz" é diferente do conceito de imobilidade. Em nossa
vida diária, quando dizemos que aquele determinado objeto está se movendo,
enquanto aquele outro está imóvel, é devido à ação da mente. Todos os
fenômenos são criados por nossa mente. De fato, os fenômenos, eles mesmos,
não fazem distinção entre o que está se movendo ou o que está imóvel. O que
faz a distinção de ser é o apego em nossa mente que é causado pela ilusão.
Se nós pudermos nos livrar deste apego, nossa mente estará então em paz e
tudo ficará em harmonia. Depois que Hui-Neng, o Sexto Patriarca, recebeu o manto e a tigela
do Quinto Patriarca, ele se escondeu durante quinze anos antes de começar a
ensinar. Um dia, quando chegou ao templo, ele viu duas pessoas discutindo
calorosamente em frente a uma bandeira. Questionavam-se por que a bandeira
estava se movendo. Um deles dizia: "Se não houver vento, como poderá a
bandeira se mover? Assim, é o vento que está se movendo." O outro disse: "Se
a bandeira não se move, como pode você saber se o vento está soprando?
Portanto é a bandeira que está se movendo. Nesse ínterim, Hui-Neng ouvia pacientemente seus argumentos.
Finalmente, lhes disse: "Por favor, não discutam mais. Não é o vento nem a
bandeira que está se movendo. É sua mente que se move." Desta troca de
palavras, podemos ver como os mestres Ch'an observam o mundo: eles olham
dentro de si, mais do que para a aparência superficial dos fenômenos.
Afinal, os fenômenos existem de maneira transitória e fragmentada. A
diferença surge em nossas mentes por causa da agitação de nossos
pensamentos. Quando nossas mentes estão tranqüilas, os objetos não são
capazes de fazer distinções por si mesmos. Contudo, quando nossas mentes
estão agitadas, diferenciamos os fenômenos, causando distinção e separação
entre nós e os outros. Portanto, a chave para realizar o estado no qual o
movimento e a imobilidade estão em harmonia, e não mais diferenciado, é
quando tivermos de fato eliminado todas as discriminações que surgem das
diferenças percebidas. Deste modo podemos alcançar a paz perfeita. O Imperador Hsien Tsung da Dinastia T'ang era um budista muito
devotado e queria mandar alguém a Feng Hsiang para buscar alguma das
relíquias de Buda. Yu Han, um oficial do governo, tentou dissuadir o
imperador dessa empreitada. Hsien Tsung ficou muito zangado com ele e
demitiu-o do posto da província de Ch'ao Chou. Ch'ao Chou estava localizada na parte sudeste da China, que não era
muito civilizada naquele tempo. Contudo, um monge bem educado e muito culto
chamado Mestre Ch'an Ta Tien estava vivendo lá. Era muito respeitado pelas
pessoas do local. Sendo um Confuciano erudito, Yu Han era muito orgulhoso de si e,
naturalmente, desprezava o Mestre Ch'an. No entanto, já que não havia
ninguém vivendo perto de Ch'ao Chou com quem ele pudesse ter uma conversa
inteligente, ele, relutantemente, foi visitar o Mestre Ch'an. Quando Yu Han chegou ao templo, o Mestre Ch'an estava meditando. Yu
Han não queria perturbá-lo, assim, decidiu ficar do lado de fora e esperar.
Depois de um longo tempo, o Mestre Ch'an ainda permanecia imóvel. Yu Han
começou a ficar impaciente. Vendo isso, o discípulo do Mestre Ch'an murmurou
para o mestre: "Primeiro, modifique-se através da meditação concentrativa,
depois erradique a arrogância através da sabedoria." Isto foi dito para o mestre Ch'an, porém, de fato, foi dirigido a
Yu Han. O que o discípulo estava indiretamente dizendo era: A meditação do
Mestre é um ensinamento sem valor para você; ele está testando sua
paciência. No momento em que você passar no teste, ele usará suas palavras
de sabedoria para livrá-lo de sua arrogância. Neste momento, Yu Han ficou
convencido de que a erudição e a cultura do Mestre Ch'an era uma verdade
profunda. Eles mais tarde tornaram-se bons amigos. Pelos exemplos acima, podemos ver que na mente dos mestres Ch'an,
mobilidade e imobilidade são intrinsecamente unidas. Este entendimento é
refletido no modo como eles ensinam. No decurso de seus ensinamentos, os
Mestres Ch'an, algumas vezes, instruem pelo silêncio e outras através de
poderosas pregações, como o rugir de um leão. Cada movimento de um Mestre
Ch'an é cheio de sutilezas do Ch'an – seja um lembrete curto, gentil ou uma
reprimenda vigorosa; um avanço ou um recuo de uma postura; uma pergunta ou
uma resposta; um franzir de sobrolho ou um sorriso; beber chá ou comer
arroz. Para a maior parte de nós, nossas experiências diárias de vida tendem
a convencer-nos que mobilidade e imobilidade são dois estados distintos.
Contudo, mobilidade e imobilidade, como acontece através da meditação
concentrativa do Ch'an são uma verdade unificada, perfeitamente livre e
natural. Prática e Compreensão
Algumas pessoas dizem que o budismo é uma filosofia. Essa é uma
afirmação do ponto de vista intelectual; contudo, a real essência do budismo
é a prática. A Verdade pode ser realizada apenas através da prática. O real espírito do budismo perder-se-á se nos limitarmos apenas ao
estudo das doutrinas e negligenciarmos a prática religiosa. Para um
praticante genuíno do budismo, discussões intelectuais sobre o budismo sem
levar em conta a prática é apenas uma forma frívola de debate e deveria ser
evitado. Se tratarmos o budismo meramente como uma filosofia, nunca
experimentaremos sua essência. Porque no budismo, compreensão e prática são
igualmente enfatizadas. Na escola Ch'an, o que é importante é a experiência
da prática real, e não a crença na linguagem escrita ou falada. Na escola Ch'an, o cultivo e a realização do Caminho são esforços
pessoais. Quanto mais extenso for o cultivo, mais perto estaremos do
despertar. Se insistirmos apenas na teoria ou simplesmente decorarmos o que
foi ouvido, não conseguiremos nenhum resultado. É como levar um cavalo
sedento para beber água; se ele se recusar a beber, eventualmente morrerá de
sede. De igual modo, todos os ensinamentos nos sutras budistas servem como
uma bússola para guiar-nos em direção à verdade. Depois de compreendê-los
precisamos praticá-los de acordo com o que aprendemos para provar do doce
orvalho do Dharma. Portanto o ditado seguinte lembra-nos que praticar é
"como beber água- apenas você saberá por si mesmo se ela é fria ou quente."
Se quisermos verdadeiramente compreender o budismo e o Ch'an, compete-nos
praticar e alcançar a realização. Ninguém pode nos dizer o que o budismo e o
Ch'an realmente são. Como os mestres Ch'an praticam e alcançam a realização? Eles
atingem a realização vivendo na comunidade da Sangha e praticando a cada
momento de suas vidas cotidianas. Os virtuosos do passado sempre diziam:
"Apanhar lenha e carregar água tudo é Ch'an. Em nossa vida diária, podemos
praticar enquanto colocamos nossas roupas, fazemos nossas refeições,
acordamos, dormindo e mesmo indo ao banheiro." O começo do Sutra do Diamante descreve como Buda levava uma
vida de sabedoria enquanto colocava seu manto, carregava sua tigela, e saía
para pedir esmolas. Assim como todos nós, as pessoas iluminadas têm que
colocar roupas e comer; no entanto, elas fazem isso de modo completamente
diferente do resto de nós. Assim dizem que o budismo não é para ser
encontrado fora da vida do mundo. Nós sempre acalentamos a concepção errada de que temos que nos
entranhar nas montanhas ou florestas para praticar e alcançar a realização.
Realmente, não precisamos nos isolar para praticar. Se pudermos extinguir o
fogo do ódio em nossos corações e mentes, então todo ambiente no qual nos
encontrarmos será um lugar fresco e confortável. Podemos até praticar no
meio do mercado mais barulhento. Se tivermos um entendimento completo dos ensinamentos do budismo e
se praticarmos de acordo com eles, seremos capazes de fazer duas vezes mais
progressos com metade do esforço. Por exemplo, o ensino básico do budismo é
a Gênesis Condicionada, que significa que todo fenômeno existente neste
universo acontece devido à reunião de condições e causas apropriadas e
cessarão de existir quando as causas e condições necessárias não estiverem
mais presentes. Não há tal coisa como um criador do universo para moldar os
eventos de nossas vidas; é a nós que compete fazer os requeridos esforços. Do ensinamento da Gênesis Condicionada, podemos inferir que todos
os seres são iguais e têm a Natureza de Buda. Todos os seres têm o potencial
de se tornarem Buda. O processo que leva à purificação deste potencial é
dependente da determinação e prática do indivíduo. Nossas próprias ações
determinam nosso futuro. Assim, o correto entendimento e a prática diligente
do ensinamento budista ajudar-nos-ão a desenvolver uma perspectiva
progressista e positiva. Do ensinamento da Gênesis Condicionada, podemos também inferir que
este universo é uma harmoniosa unidade. Todos os fenômenos e todos os seres
são interdependentes. Com este entendimento, podemos facilmente ver como a
centralização é contraditória à harmonia e porque a distinção entre eu
versus outros deveria ser abolida. A fim de viver em harmonia com os
outros, deveríamos direcionar nossos cuidados e ajudar a eles e não ficar
centrado em nós mesmos. Pureza e Impureza
A própria natureza não faz nenhuma distinção entre pureza e
impureza, ou beleza e feiúra. São nossas preferências e aversões subjetivas
que fazem a distinção. É dito no Sutra Vimalakirti: "Quando nossa mente for pura, a
terra será pura." As mentes comuns, contudo, são nubladas pelas "cinco
poeiras" (os objetos que são percebidos pelos cinco sentidos) e enganadas
pela aparência exterior de todos os fenômenos, evitando que a natureza de
todos os dharmas seja vista. As mentes dos mestres Ch'an realizados são
puras e desobstruídas. Suas mentes são a Mente de Buda e elas podem ver a
natureza real de todas as coisas. Para eles não há diferença entre bem e
mal, beleza e feiúra, errado ou certo, enquanto que um ser comum vê o mundo
corrupto e impuro. Os mestres Ch'an vêm o mundo como a terra pura de Buda. O estado Ch'an da mente não é alguma coisa que se pode fingir ou
argumentar. Uma vez o mestre Ch'an, Chao Chou fez uma aposta com um
discípulo seu, Wen Yen. Quem pudesse comparar-se com a coisa mais baixa e
insignificante seria o vencedor. O mestre Chao Chou disse: "Eu sou um burro." Wen Yen disse: "Eu sou o traseiro do burro." Chao Chou disse: "Eu sou o excremento do burro." Wen Yen disse: "Eu sou a larva dentro do excremento." O mestre Chao Chou ficou aturdido e não pôde continuar, mas
perguntou: "O que você está fazendo no excremento?" Wen Yen respondeu: "Estou me refrescando do calor do verão!" Como as mentes dos mestres Ch'an são puras, eles se sentem
confortáveis até mesmo nos lugares considerados os mais imundos. Para eles,
todos os lugares são a terra pura; portanto, sentem-se livres onde quer que
vão. Um dia, o Mestre Ch'an Yi Hsiu saiu com seu discípulo. Os dois
chegaram à praia de um rio onde uma mulher estava hesitando atravessar a
corrente veloz da água. Por compaixão, o Mestre Yi Hsiu carregou a mulher
através do rio em suas costas. Tendo feito isso, mais tarde esqueceu-se do
fato. Seu discípulo, contudo, estava muito incomodado pelo fato do mestre
ter carregado uma mulher em suas costas. Um dia, o discípulo disse ao Mestre
Yi Hsiu: "Mestre, uma coisa está me incomodando muito. O senhor pode me
ajudar a resolver este problema?" O Mestre Ch'an respondeu: "Oh! O que é?" O discípulo disse: "O senhor sempre nos ensinou a guardar distância
de mulheres. Mas há vários meses atrás, o senhor carregou uma mulher através
do rio. Isto não é contraditório a seus ensinamentos?" Ao
ouvir isso, o Mestre Ch'an Yi Hsiu exclamou: "Ah! Eu apenas carreguei aquela
mulher de um lado do rio para o outro e ela ficou lá, mas você, coitado,
tem-na carregado por aí em suas costas por vários meses!" Por esta história, podemos ver que o estado de mente dos mestres
Ch'an é aberto e indiscriminado. Os mestres Ch'an não discriminam entre o
puro e o impuro, o macho e a fêmea. Eles compreendem que a mente, o Buda, e
todos os seres são iguais. Prática do Ch'an
Hoje conversei com vocês durante um longo tempo. Fico imaginando se
vocês foram capazes de provar um pouco do maravilhoso sabor do Ch'an.
Contudo, o Ch'an não é alguma coisa que se possa experimentar através de
meras palavras; é necessário ser praticado. Gostaria de dar algumas
sugestões de como praticar o Ch'an. Investigar o Ch'an através da dúvida —
Em outras religiões, não há lugar para a dúvida; temos que acreditar
incondicionalmente. Mas o Ch'an encoraja-nos a começar pela dúvida. Uma
pequena dúvida levará a uma pequena realização. Sem a dúvida, não haverá
realização.
Procure a realização através da contemplação —
Uma vez a dúvida despertada, precisamos contemplá-la a fim de alcançar a
realização. Kung-an e hua-tou como "Qual era nossa face original
antes de termos sido gerados pelos nossos pais?" "Os cães têm a Natureza de
Buda?", são planejadas para levantar dúvida pelo praticante Ch'an.
Contemplação diligente do Kung-an e Hua-Tou levarão eventualmente à
realização. Estudo do Ch'an pelo questionamento — Quando
contemplando hua-tou a coisa mais importante é continuar se questionando até
a realização ser alcançada. É como tentar apanhar um ladrão; temos que
continuar perseguindo sem desistir. Por exemplo, quando contemplando "Quem
está recitando o nome do Buda" podemos perguntar, "É a mente que está
recitando?" "Quem é a mente?" Se a mente sou eu, então é a boca que está
recitando o nome do Buda, não eu?" "Se a boca sou eu, então é o corpo que
faz prostrações ao Buda, não eu?" "Se o corpo sou eu, então são os olhos que
prestam homenagem à imagem de Buda, não eu?" Se prosseguirmos a inquirir
desse modo, a realização será alcançada. Realize o Ch'an através da experiência pessoal —
Para praticar o Ch'an, temos que começar duvidando, contemplando,
questionando; mas o estágio final e mais importante é a experiência pessoal. O Ch'an não é algo que é expresso em palavras não contempladas por
nossos corações e mentes; de fato, temos que abandonar tudo isso para
experimentar o Ch'an. Realização é o estado da mente que não pode ser descrito em
palavras. O Ch'an pode apenas ser experimentado por aqueles que o
alcançaram. Você já ouviu um riacho murmurante? Isto é o som do Ch'an Você já
olhou para as folhas verdes de um salgueiro? É a cor do Ch'an. Você já viu o
coração do lótus florescer? É a mente do Ch'an. Ler obras espirituais nos faz evoluir espiritualmente. Leia nossos textos para sua evolução espiritual, eles são espirituais, ou uma sugestão de luz: leia um texto nosso semanalmente. Conheça o texto: Como Evoluir Espiritualmente. |